Decisões polêmicas, R$ 30 mil em diárias e críticas da população: entre erros e acertos, “Boca” completa 100 dias na Prefeitura de São Borja

A sensação, nas ruas e redes sociais, é de que a gestão ainda não encontrou um norte

Após vencer uma eleição acirrada com 53,71% dos votos válidos, José Luiz Machado, o “Boca”, assumiu a Prefeitura de São Borja em 1º de janeiro.

Cem dias depois, sua gestão acumula decisões controversas, dificuldades operacionais e críticas constantes da população — além de gastos elevados com viagens.

A reportagem do Fronteira 360 analisou os principais atos do início de sua administração.

Decisões polêmicas

Carnaval cancelado e corte nomeada sem concurso

Logo nos primeiros dias de mandato, o prefeito tomou a decisão de nomear diretamente a Corte do Carnaval e do Município, ignorando o tradicional concurso que envolvia a participação da comunidade e valorizava a diversidade, especialmente com presença significativa de representações LGBTQIAPN+.

No dia seguinte à nomeação, a Prefeitura anunciou também o cancelamento do desfile de carnaval, alegando falta de prestação de contas das Escolas de Samba.

A escola Mociviu contestou a justificativa, alegando que não havia sido sequer chamada para apresentar os documentos.

A polêmica sobre a escolha da corte foi amenizada após a justificativa oficial, mas o episódio expôs falhas de comunicação e planejamento no início da gestão.

Pedido de “trégua” na Câmara

Outro ponto que gerou estranhamento foi o pedido do Prefeito de “uma trégua” de seis meses ou 180 dias para “organizar a casa”. A informação foi confirmada recentemente pelo vereador Arlei Fagundes (PT).

A solicitação foi criticada por soar incoerente, já que o atual mandato é uma continuidade da gestão anterior, também do Partido Progressista (PP), além de levantar questionamentos sobre em que estado o ex-prefeito deixou a “casa”.

Criação de comissão consultiva

Com menos de dois meses de mandato, o prefeito de São Borja, José Luiz Rodrigues Machado, assinou o Decreto nº 21.158, nomeando os membros da recém-criada Comissão Consultiva Superior. A medida, prevista na Lei Municipal nº 6.177, de 6 de dezembro de 2024, visa reestruturar a organização do Poder Executivo.

No entanto, a decisão não passou despercebida e gerou críticas de parte da população e da oposição ao governo, que interpretaram a iniciativa como um sinal de desorganização e falta de rumo da nova gestão.

Formada por membros voluntários e sem remuneração, em sua maioria empresários, a comissão tem como proposta assessorar o prefeito em decisões estratégicas e na coordenação entre os órgãos da administração.

Segundo a justificativa oficial, o objetivo seria ampliar a participação, melhorar a comunicação interna e aumentar a eficiência da gestão.

Apesar disso, vereadores oposicionistas questionam a necessidade de criar um novo colegiado já no início do mandato, sugerindo que o prefeito estaria enfrentando dificuldades para conduzir a administração e tomar decisões de forma autônoma.

Outra crítica foi a ausência de representações femininas na comissão.

A criação da comissão, em vez de reforçar a confiança no novo governo, acabou alimentando a percepção de insegurança administrativa e de que a gestão ainda não encontrou um caminho claro nos primeiros passos à frente do município.

Fechamento de escola e problemas no transporte

Em fevereiro, o anúncio do fechamento da Escola Bom Sucesso, na localidade de São Marcos, com a intenção de cortar gastos públicos, motivou protestos.

Após reunião com as comunidades afetadas, a Prefeitura recuou da decisão, mas instituiu aulas em turno único e turmas multisseriadas, nas quais alunos de diferentes séries estudam na mesma sala e com a orientação de uma professora apenas. O ato que gerou novas críticas sobre a qualidade do ensino.

Outra medida controversa foi a suposta proibição de entrada dos ônibus escolares em propriedades rurais, denunciada por uma mãe em postagem nas redes sociais.

A exigência de que alunos caminhem até as estradas principais gerou indignação entre pais, que denunciaram os riscos enfrentados pelas crianças, especialmente durante os períodos de intenso calor registrados no início do ano.

“Queria ver se fosse os filhos dele no lugar. Não bastou deixar a escola em um turno só, agora quer fazer isso com os alunos”, questionou uma mãe durante um desabafo nas redes sociais.

O tema chegou à Câmara Municipal, com cobrança de explicações por parte do vereador Junior (PDT).

Corsan e a falta de ação da Prefeitura: silêncio e paciência em meio ao caos

Desde que assumiu a Prefeitura de São Borja, o prefeito José Luiz “Boca” Machado herdou um problema explosivo: a privatização da Corsan e a consequente piora nos serviços de abastecimento e saneamento básico.

A bomba, no entanto, foi armada antes mesmo de sua posse, com participação direta do ex-prefeito Eduardo Bonotto — que, além de seu antecessor, foi também presidente da Famurs e defensor público da venda da estatal.

A ligação política é evidente. O Partido Progressista, ao qual Boca e Bonotto pertencem, teve a maioria de seus deputados votando a favor da privatização. Bonotto, como representante dos prefeitos do estado, também se posicionou favorável à entrega da Corsan à iniciativa privada.

O resultado até agora: algumas obras iniciadas e avanços no saneamento básico, mas acompanhadas por uma disparada no preço da tarifa de água — que tem sido repassado diretamente à população, penalizada por investimentos que não foram previamente debatidos com clareza.

Desde o começo do ano, denúncias de cobranças abusivas, ruas esburacadas e obras mal fiscalizadas tomaram conta das redes sociais. Em outras cidades, como Passo Fundo e Santa Maria, os prefeitos adotaram uma postura firme, multando a empresa e exigindo responsabilidade.

Em São Borja, no entanto, o cenário é outro: Boca limitou-se a reuniões a portas fechadas e manifestações verbais, sem qualquer medida concreta ou penalidade pública à Corsan.

A sensação nas ruas é de abandono. Em reportagem do Fronteira 360, uma moradora afirmou com todas as letras que o prefeito “não fez nada” para resolver a questão. A declaração sintetiza o sentimento de parte da população, que esperava mais atitude e menos condescendência.

Em entrevista à Rádio Cultura AM, o prefeito declarou que “não adianta entrar com processos” contra a empresa e pediu paciência à população. Como solução, recomendou que os moradores procurem o Procon — uma resposta que muitos enxergam como uma tentativa de tirar o problema das mãos da Prefeitura.

Obras de pavimentação suspensas

Em março, o prefeito anunciou que não haveria obras de pavimentação em 2025, justificando a decisão como uma forma de evitar retrabalho devido às intervenções da Corsan-Aegea.

Com cerca de 700 quadras aguardando pavimentação em São Borja, a justificativa não foi suficiente e levantou críticas de moradores que alegaram que há regiões onde a instalação da tubulação já foi concluída, o que permitiria a retomada imediata da pavimentação.

O vereador Matteus Bronzoni (PDT) acusou a administração de falta de planejamento ou de má gestão de recursos, destacando que em 2024, ano eleitoral, a prefeitura investiu dez vezes mais em calçamento do que no ano anterior.

Abandono dos museus

Uma reportagem do Fronteira 360 revelou o estado crítico de abandono dos museus de Getúlio Vargas e João Goulart. O museu de Vargas, em especial, enfrenta infiltrações, rachaduras e risco de desabamento da porta principal. O caso repercutiu a nível nacional, chegando a ser tema de uma coluna no jornal O Globo do Rio de Janeiro, um dos mais tradicionais do Brasil.

A Secretaria de Educação e Cultura não se pronunciou sobre o caso, nem apresentou plano de recuperação dos espaços — o que reacendeu o debate sobre a preservação do patrimônio histórico da cidade.

Prefeito de São Borja já gastou mais de R$ 30 mil em diárias nos primeiros 100 dias de governo

Em pouco mais de três meses à frente da Prefeitura de São Borja, o prefeito José Luiz Machado já gastou R$ 30.251,25 em diárias. O valor chama atenção: é o maior registrado nesse mesmo período desde 2018, superando inclusive os gastos do ex-prefeito Eduardo Bonotto em seus primeiros quatro meses durante todos os seus anos de gestão. Só para comparar, em 2024, Bonotto havia gasto R$ 20.396,25 no mesmo recorte de tempo.

Se continuar nesse ritmo, o gasto total com diárias pode chegar perto de meio milhão até o fim do mandato. Segundo o Portal da Transparência, esse tipo de despesa serve para cobrir alimentação, hospedagem e transporte urbano durante viagens a serviço ou eventos oficiais.

Grande parte desse valor se explica pela intensa agenda de viagens do prefeito.

Confira alguns dos compromissos já realizados fora da cidade:

03/01 – Santo Ângelo: evento da Associação dos Municípios das Missões

08/01 – Foz do Iguaçu: reuniões sobre o leilão da Ponte Internacional

15/01 – Porto Alegre: encontros com Famurs, Secretaria da Saúde e Secretaria do Esporte

23/01 – Santo Ângelo: encontro regional sobre saúde pública

21/02 – Xangri-lá: Assembleia de Verão da Famurs

10/03 – Porto Alegre: reuniões com a Secretaria de Educação e Famurs

20/03 – Uruguaiana: presença no carnaval fora de época

04/04 – Nova ida a Foz do Iguaçu para seguir tratando da ponte Internacional

Apesar de algumas pautas importantes na agenda, o valor elevado dos gastos com diárias chama a atenção.

Entre erros e acertos: o que deu certo até agora

Apesar das polêmicas, há acertos a serem reconhecidos. Segundo a Prefeitura, São Borja lidera na geração de empregos entre os municípios da região missioneira.

O governo também abriu licitação para instalação de lâmpadas LED e novos semáforos, num investimento de R$ 2 milhões que vai garantir uma modernização da infraestrutura urbana da cidade.

Outras ações positivas incluem a restauração do restaurante popular, com aumento no número de refeições servidas, a oferta de cursos profissionalizantes gratuitos e avanço de obras no Ginásio Cleto Dória Azambuja e no Parcão — esta última uma antiga demanda da população.

Um governo em busca de rumo

Ao completar 100 dias à frente da Prefeitura, o prefeito José Luiz Machado ainda enfrenta mais desafios do que colhe elogios.

A condução hesitante em temas centrais, como educação, clareza sobre quais são as prioridades do governo e a cobrança sobre a Corsan, tem frustrado parte da população.

A sensação, nas ruas e redes sociais, é de que a gestão ainda não encontrou um norte.

Questionado sobre as críticas em entrevista à Rádio Cultura AM, o prefeito minimizou os comentários e afirmou: “Eu não olho redes sociais, não dou bola para isso. Fui eleito para trabalhar”.

É exatamente isso que a população de São Borja espera ver nos próximos meses: menos justificativas e mais resultados concretos. Afinal, o tempo de trégua está chegando ao fim e a “casa” precisa de muitas reformas.

O Fronteira 360 segue acompanhando de perto as ações da Prefeitura, exercendo seu papel de fiscalizar, cobrar soluções para os problemas da cidade e também reconhecer e divulgar as boas iniciativas que beneficiam a população.

Maicon Schlosser

Jornalista

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